Um Olhar Honesto sobre os Problemas dos Lubrificantes de Grau Alimentício

Como Especialista em Lubrificação em uma fábrica de grau alimentício, eu enfrento desafios únicos que precisam ser pensados na hora de escolher e usar lubrificantes de grau alimentício. Eu trabalho na Blue Buffalo, onde fazemos comida para cães e gatos, mas nossas regras — definidas pela FDA e pela NSF — são as mesmas seguidas por nossas empresas “irmãs” que produzem comida para humanos.

Já se foi o tempo em que se dizia: “é só comida de cachorro, não importa o que tem dentro”. Hoje, os “pais” de pets se importam tanto com a comida de seus animais quanto com a sua própria. Precisamos realizar testes rigorosos para garantir que o que está na tabela nutricional da embalagem (teor de proteína, teor de gordura etc.) esteja realmente dentro dela.

Nenhuma substância estranha é permitida, e as porcentagens dos fatos nutricionais devem estar exatas. Tudo o que é possível deve ser feito para garantir que haja apenas comida de pet de boa qualidade na embalagem e nada mais. Especialmente nada que possa, potencialmente, adoecer os animais.

Isso nos leva aos lubrificantes. Toda fábrica precisa de máquinas para fazer seus produtos. Essas máquinas precisam de lubrificação para funcionar: graxa para os rolamentos das esteiras, óleo para os sistemas hidráulicos e óleo para as caixas de engrenagens.

Desde os anos 1960, quando as regras foram estabelecidas pela NSF no “Livro Branco” de produtos químicos aprovados para uso em instalações de produção de alimentos, os lubrificantes de grau alimentício são vistos como se não fossem tão bons quanto os lubrificantes comuns (de grau não alimentício).

Esses dias também acabaram. Com as melhorias nas fórmulas e nos aditivos (componentes químicos) dos lubrificantes, eles se tornaram, no mínimo, comparáveis em desempenho aos seus equivalentes “não alimentícios”, ao mesmo tempo em que mantêm a certificação de segurança alimentar.


“Seguro para Alimentos”?

O que realmente significa ser “seguro para alimentos”?

De acordo com a FDA e a NSF, os níveis permitidos de lubrificantes vindos de um contato acidental (incidental) são de 10 partes por milhão (ppm).

O que são 10 ppm? Como você pode ver na imagem de 100.000 pontos pretos com um ponto vermelho misturado, 10 ppm é algo quase imperceptível:

Esse é o nível permitido de lubrificante industrial na comida. Se acontecer algo mais do que um contato acidental, substâncias estranhas como lubrificantes podem aparecer nos testes — ou pior, podem não ser detectadas.

Houve muitos recalls (recolhimentos de produtos) de alimentos ao longo dos anos envolvendo lubrificantes, devido a cheiro ou sabor estranho ou, pior ainda, consumidores que ficaram doentes.

O custo total de um recall é devastador e não se limita apenas ao custo logístico de trazer o produto de volta para o fabricante. Ele deve ser removido das prateleiras das lojas, e os consumidores devem ser avisados pela mídia que aquilo que eles pensavam ser seguro, pode não ser, e que devem parar de usar o produto imediatamente e devolvê-lo para reembolso.

A perda de confiança do consumidor no seu produto é algo do qual sua empresa pode, muito possivelmente, nunca se recuperar.

A melhor solução, na minha opinião, é a exclusão total dos lubrificantes. Mesmo que eles sejam listados como “grau alimentício”, você ainda deve tentar impedir que eles entrem no fluxo do produto. É assim que eu faço o meu melhor para realizar essa tarefa.


Rolamentos

Rolamentos e a graxa que permite que eles funcionem são uma necessidade. Se você tem um rolamento que precisa de três gramas de graxa por mês para funcionar corretamente, NÃO BASTA injetar seus três gramas e dizer “até o mês que vem”.

Especialmente se este rolamento estiver sobre a linha de produção, esses três gramas de graxa nova irão, ao longo do próximo mês, empurrar para fora os três gramas adicionados no mês anterior. Os rolamentos são projetados para expulsar (purgar) a graxa velha através de suas vedações (sejam de lábio ou labirinto).

Todo mundo já viu aquele acúmulo de graxa na borda de um rolamento. Se deixarmos acumular sem remover a graxa expelida, ela vai cair direto no produto!

Embora a graxa seja tecnicamente de “grau alimentício”, minha principal preocupação não é com a graxa em si. Minha preocupação com o acúmulo de graxa usada e expelida são os outros materiais que estão nela.

A graxa nova geralmente tem uma cor completamente diferente da graxa que é expelida pelas vedações de um rolamento após o uso. Conforme o rolamento funciona, ocorre o desgaste normal, e metais são “capturados” pela graxa e carregados para fora durante a relubrificação.

Essa é minha principal preocupação com a graxa de grau alimentício usada: ela não pode mais ser considerada de grau alimentício. A graxa usada pode conter Cobre, Estanho, Níquel, Metal Babbit, Latão ou qualquer outro material de que os componentes internos dos rolamentos sejam feitos.

Além disso, a graxa em superfícies expostas atrai e retém qualquer sujeira ou detrito que esteja no ar da sua fábrica. À medida que o lubrificante se degrada, ácidos e vários outros compostos químicos que também podem ser prejudiciais podem se formar.

Como a maioria das pessoas na área de manutenção, eu tenho minhas manutenções preventivas (PMs) mensais e semanais. Eu aplico graxa mensalmente e faço inspeções semanalmente. Durante cada uma delas, eu limpo as bordas dos rolamentos para remover a graxa acumulada toda vez que vejo aquele rolamento.

Exagero? Talvez, mas fazendo isso, eu garanto a exclusão que estou buscando. Também é simplesmente uma boa prática de organização e limpeza (housekeeping) limpar os rolamentos, mesmo que não estejam sobre uma linha de produção. Uma grande mancha de graxa expelida feia pendurada no rolamento, ou empilhada sobre o que quer que esteja abaixo dele, para mim, não reflete orgulho em seu trabalho. Também demonstra falta de cuidado para qualquer supervisor que passe por ali.


Rolamentos Novos ou de Reposição

Antes de trocar os rolamentos, você deve descobrir qual lubrificante está dentro deles. Se os rolamentos estiverem em uma “zona de não contato”, onde você pode garantir 100% que não haverá contato algum com o alimento, este não é um ponto crítico de controle.

Mas se os rolamentos estiverem próximos ou em contato com a “zona do produto”, é aí que é importante saber com o que o rolamento foi preenchido pelo fabricante. Alguns rolamentos vêm cheios de graxa, alguns pela metade, e alguns com nada mais do que uma leve camada de óleo para evitar ferrugem antes da instalação.

A quantidade e o tipo de graxa é algo que você precisa saber, especialmente no caso de um rolamento genérico de reposição pego na prateleira. Lavar (flushing) o rolamento com graxa de grau alimentício pode ser necessário, e esse é outro exemplo de boa organização, como mencionei antes.

Uma vez, peguei uma máquina nova que recomendava relubrificar com uma graxa asfáltica, igual à que vinha de fábrica. Boa informação para saber de antemão! Felizmente, aqueles rolamentos estavam em uma zona de não contato e puderam ser lavados e preenchidos com a minha graxa aprovada H1, em vez de serem devolvidos por um rolamento diferente preenchido com graxa de grau alimentício.


Caixas de Engrenagens

Normalmente, as caixas de engrenagens ficam longe o suficiente do fluxo de produto, então você poderia não precisar de óleo de grau alimentício. Eu digo “normalmente”, “longe o suficiente” e “poderia” por um motivo. Você está disposto a correr o risco? Minha fábrica não está, e nem eu.

Caixas de engrenagens têm vedações (selos) que, eventualmente, vazarão ou falharão. Se estiverem perto o suficiente ou sobre o fluxo do produto, isso pode se tornar um problema. Enquanto os rolamentos podem vazar uma pequena quantidade de graxa no seu produto, uma caixa de engrenagens pode, no caso de uma falha catastrófica da vedação, despejar uma grande quantidade de óleo.

Nesse caso, você provavelmente saberia que isso aconteceu e o produto afetado poderia ser descartado. O mais provável é o caso de uma vedação que vaza lentamente e introduz óleo aos poucos no produto, o que pode não ser detectado imediatamente. É aí que ter um óleo H1 (grau alimentício) é a sua proteção.

Assim como a graxa de grau alimentício, o óleo de engrenagem de grau alimentício tornou-se igual aos outros óleos industriais em qualidade. As fórmulas dos aditivos no óleo são robustas e fornecem boa proteção às engrenagens, mantendo a certificação de grau alimentício.

Assim como no caso de rolamentos novos, é importante saber com o que a caixa de engrenagens vem preenchida de fábrica. Como as caixas de engrenagens são geralmente um item de maquinário genérico, o óleo dentro delas fica a critério do fabricante (OEM) e provavelmente não é de grau alimentício, nem mesmo da qualidade que você procura.

Eu rodo uma caixa de engrenagens nova por 500 horas, ou cerca de 30 dias, durante o período de “amaciamento” (break-in). Depois, eu dreno, lavo (flush) e encho com meu óleo de grau alimentício pré-filtrado. O período de amaciamento serve para soltar toda a sujeira e detritos e garantir que a caixa de engrenagens não falhe em seu início de vida.

O lubrificante de corrente em spray também é um item crítico que precisa ser de grau alimentício. As correntes de acionamento das esteiras parecem estar sempre muito perto das zonas de produto e, portanto, precisam ser H1. Assim como em todos os outros equipamentos que mencionei, uma boa organização e limpeza é necessária. Não lubrifique em excesso e mantenha limpo.

Em resumo, “grau alimentício” não significa mais que o lubrificante é de qualidade inferior. Eu tenho várias caixas de engrenagens que estão funcionando há 6 anos com o mesmo óleo.

Eu apenas o mantenho limpo, seco e frio, e monitoro os aditivos com análises de óleo regulares. Também realizo uma filtragem externa (conhecida como “kidney loop” ou “diálise”) do óleo se uma contagem elevada de partículas assim exigir.

Lubrificantes de grau alimentício exigem precauções extras, principalmente manter as máquinas limpas para proteger o produto.

Lembre-se sempre: 10 ppm não é muita coisa — e assim como seus pais lhe diziam: LIMPE A SUA PRÓPRIA BAGUNÇA!!

[Traduzido pela equipe de conteúdos da Noria Brasil]

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